Uma trilha de histórias

A estrada que leva a uma viagem inesquecível ao passado


O caminho para o Litoral Sul paulista é muito belo. Formado por diversas espécies de árvores e flores, cachoeiras que caem entre a serra, formando uma paisagem que se vê do carro quando em direção à Baixada Santista. Mas apreciar mesmo toda essa beleza é fazer uma caminhada por meio da Mata Atlântica que compõe todo esse cenário.
Esse trajeto foi construído para o escoamento da cana-de-açúcar e, com a chegada da era automobilística, algumas mudanças aconteceram, para que os carros também pudessem passar por ali. Posteriormente, houve a construção da Rodovia Anchieta, sendo esquecida a velha estrada. Por ali, passavam apenas alguns motoristas, a fim de escapar do trânsito. Mas com a queda de duas pontes, a estrada teve de ser fechada.
Após ser restaurada, foi reaberta em 2004 para receber somente visitantes, sendo cobrada uma taxa para manutenção do Pólo Ecoturístico Caminhos do Mar. Entre descer a serra e o retorno são 16 quilômetros percorridos, com muitas curvas. Tem uma até chamada curva da morte, devido a vários acidentes que já aconteceram ali. As pessoas que vão fazer a caminhada devem respeitar os seus limites físicos e seguir as orientações dos monitores.
Do Marco Zero de São Paulo, na Praça da Sé, até a guarita de entrada do local são 47 quilômetros. É necessário acordar cedo, levar lanche, boné, água, passar o protetor solar e repelente, usar roupa e tênis confortável e não esquecer uma sacolinha para jogar o lixo, ajudando na conservação ambiental. A câmera também deve estar na mochila, pois nada pode ser arrancado, apenas fotografado, e há muito para se registrar.
O passeio começa no quilômetro 42 da estrada Caminhos do Mar. Após 15 minutos de caminhada, aproximadamente, está o Pouso de Paranapiacaba, cujo significado na Língua indígena Tupi é: “lugar de onde se vê o mar”. Este é um dos monumentos construídos em 1922 para homenagear o centenário da Independência do Brasil. A casa de pouso servia de local para descanso dos viajantes, além de ser ponto de encontro para a realização de saraus no tempo do modernismo. Os ambientes ainda guardam o ar hospitaleiro.
O canto dos pássaros e o som dos riachos e cachoeiras são descansos para os ouvidos dos paulistas. Com o passar da hora, a neblina, que às vezes está presente, se desfaz e a natureza mostra-se exuberante. “É difícil acreditar que caminho em uma estrada que liga Santos à grande metrópole paulista. O passeio é encantador, vale a pena. O clima é diferente do encontrado em meio à poluição de São Paulo. Não há tempo ruim para estar aqui”, afirmou a química Aureliana Cardoso, que saiu às 6 horas da manhã da capital para realizar o passeio.
No local onde os tropeiros e escravos descansavam foi construído o Belvedere Circular, um mirante que proporciona uma boa visão do litoral. Diferente dos outros monumentos encontrados no caminho, este não tem detalhes portugueses. A atenção nesse ponto está para o que fica em frente ao Belvedere, a Calçada do Lorena, que tem mais de 200 anos, por onde também passou a família real portuguesa. Quando os visitantes da estrada decidem aventurar-se por ela, a monitora Alice Roberta Cardoso lembra: “Sempre falo para as pessoas deixarem as mãos livres no caso de eventuais escorregões”.
Para homenagear Bernardo José Maria de Lorena, o responsável pela construção dessa calçada, há o Padrão do Lorena. Para quem deseja descer até o meio do caminho, este é o último monumento antes do retorno. Os monitores só permitem a continuação da descida para quem chega nesse ponto até as 11 horas para que se cumpra o tempo da volta, que deve acontecer até as 16 horas. O Padrão do Lorena também é muito utilizado para piquenique, como fez a professora Denise Santos, que estava com um grupo de amigos.Vamos aproveitar para uma confraternização”, disse, enquanto preparava o lanche. “Após nos reabastecermos, continuaremos a caminhada”, contou.
Quando construído, o caminho recebeu o nome de estrada da Maioridade, dedicado à emancipação de D. Pedro II. Uma casa alta, com passagens misteriosas dentro dela, representa bem este momento do Império brasileiro. O Rancho da Maioridade possui, nos azulejos das paredes laterais, imagens desenhadas que retratam os governantes do país antes da coroação do monarca.
Nos locais em que as curvas na estrada se acentuam em precipícios, são momentos de olhar para o alto e para baixo, observando tudo que compõem o lugar. O Pontilhão da Raiz marca o fim do trajeto, mas o início da subida da serra e o retorno para o km 42 da Estrada Velha de Santos. As descobertas de monumentos que contam histórias do país ainda não terminam em meio à Mata Atlântica. Curiosamente em área urbana, o Cruzeiro do Quinhentista chama a atenção para os azulejos das cores azul e amarelo, que o compõem. Ali está desenhado a chegada dos portugueses e algumas mudanças que aconteceram para quem já estava no Brasil. “Eu vim pensando na aventura que encontraria aqui, mas a história também me envolveu muito. A arquitetura e as imagens contam o que acontecia na época do descobrimento e, também, da independência do Brasil, como os azulejos que mostram a catequização dos índios. Aprender isso na escola não me chamou tanta atenção como aqui”, ressaltou o estudante Willian Carlos Alvez, de 17 anos, que fez o passeio acompanhado da família.
Embora o retorno dos 16 km seja cansativo, é impulsionado pela vontade de estar outra vez no percurso que, em meio à natureza, relata os acontecimentos e faz despertar os outros sentidos, marcando em quem o trilha uma nova história.

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